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Taxa de Câmbio: é um dos principais problemas enfrentados pela indústria

Embora a alta do dólar tenha estimulado a exportação de produtos nacionais, a volatilidade da moeda norte-americana deixa empresários inseguros na hora de investir. Enquanto fabricantes nacionais de bens de capital tentam aproveitar a depreciação do real ante o dólar para ganhar mercado externo, importadores de máquinas e equipamentos lutam para garantir negócios com indústrias que necessitam investir em produtividade e tecnologia.

“Os setores que dependem da importação de produtos continuarão com problemas ainda mais graves em 2016, pois a taxa de câmbio nominal ainda tem uma tendência de depreciação perante o dólar, ou seja, a taxa de dólar nominal pode continuar a subir para R$ 4,20/R$ 4,50”, economista Luciano D’Agostini.

A Sondagem Industrial, divulgada pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) em setembro deste ano, mostra que a dificuldade enfrentada pela indústria no 3º trimestre de 2015 é comparável à observada na crise financeira de 2008/2009. “O longo período de queda da atividade continuou a afetar as condições financeiras das empresas. A insatisfação com as margens de lucro e situação financeira aumentou no terceiro trimestre. Além disso, o acesso ao crédito tornou-se ainda mais difícil”. A Sondagem mostrou o que os empresários entrevistados julgaram ser os principais problemas enfrentados pela indústria no terceiro trimestre deste ano. O destaque da pesquisa foi a importância da taxa de câmbio, que subiu quatro posições no ranking revelado pela CNI.

O principal problema enfrentado pela indústria no terceiro trimestre deste ano foi a elevada carga tributária, de acordo com 44,9% dos empresários entrevistados (2.468 empresas foram consultadas entre os dias 1 e 15 de outubro). O trimestre anterior não foi diferente, o problema foi apontado por 44,8% dos empresários. A demanda interna insuficiente foi indicada por 42,2% dos entrevistados como o segundo maior problema enfrentado pela indústria nacional.

Já a taxa de câmbio passou da oitava para a quarta posição do ranking, assinalado por 27,5% dos empresários entrevistados nesse trimestre. Somente entre os exportadores, a volatilidade cambial é o terceiro pior problema da indústria. Em setembro deste ano, o dólar ultrapassava a margem histórica de R$ 4,00. No mesmo mês, uma pesquisa realizada pela TOV Corretora indicava que o Real é a segunda moeda que mais se desvalorizou em 12 meses, perdendo somente para a moeda da Rússia. “A falta de uma estrutura de custos competitiva e de uma política comercial moderna não permite ao empresário traçar uma estratégia comercial orientada para a inserção internacional e que, assim, impulsione as vendas externas”, diz a pesquisa da CNI (ver gráfico 1).

Para o economista pós-doutorando em economia monetária pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Luciano D’Agostini, o dólar a R$ 4,00 permite a competitividade da indústria nacional de bens e serviços no mercado internacional. Entretanto, a indústria manufatureira brasileira é uma indústria de montagem com pouca complexidade tecnológica nacional – com raras exceções –, ela depende de muita importação.

“Os setores que dependem da importação de produtos continuarão com problemas ainda mais graves em 2016, pois a taxa de câmbio nominal ainda tem uma tendência de depreciação perante o dólar, ou seja, a taxa de dólar nominal pode continuar a subir para R$ 4,20/R$ 4,50. A gente exporta minério de ferro, alguns tipos de metais e produtos agropecuários. Aproximadamente, 65% do que se exporta no Brasil são produtos primários. Não temos uma indústria de tecnologia para exportação”, diz D’Agostini.

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“O Brasil precisa de uma mudança não só do câmbio, mas uma reestruturação macroeconômica focada em educação. A indústria nacional, então, não dependeria só do câmbio para competir no mercado internacional”, economista Luciano D’Agostini.

O economista estima que, em 2016, haverá uma nova rodada de depreciação, principalmente em consequência do rebaixamento da nota do Brasil pelas agências de risco internacionais. Para ele, a economia chinesa e a brasileira em crise e a tendência do aumento de taxas de juros, a partir de dezembro nos Estados Unidos, são peças-chaves na nova rodada de depreciação da moeda brasileira. “O Brasil precisa de uma mudança não só do câmbio, mas uma reestruturação macroeconômica focada em educação. A indústria nacional, então, não dependeria só do câmbio para competir no mercado internacional, mas com o tempo – 20 anos se começasse agora – poderia aumentar a complexidade tecnológica dos produtos exportados”.

Embora a alta do dólar tenha estimulado a exportação de bens manufaturados, as incertezas referente ao câmbio e à economia desencorajam alguns empresários a investir nesse caminho e se torna um problema tanto para fabricantes quanto para importadores de bens de capital. Por isso, a Manufatura em Foco entrevistou o diretor de competitividade da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), Mario Bernardini, e o presidente da Associação Brasileira dos Importadores de Máquinas e Equipamentos Industriais (Abimei), Ennio Crispino, para saber de que maneira a alta do dólar tem influenciado fabricantes e importadores de máquinas e equipamentos industriais.

Diretor de Competitividade da Abimaq – Mario Bernardini

MF: De que maneira o dólar tangenciando R$ 4,00 favorece a indústria nacional?

MB: Sim, um câmbio assim é fundamental para a indústria, porque ganhamos competitividade em relação aos produtos importados vendidos no Brasil, que eram mais baratos que os nossos – exatamente em função do câmbio – e que nos últimos anos ocupavam um espaço considerável no nosso mercado. Segundo, e tão importante quanto, um câmbio favorável permite que voltemos a exportar, aumentar a exportação de manufaturados. Não é um trabalho fácil nem de resposta imediata, mas esse câmbio permite começar a fazer esse trabalho de recuperação de mercados que foram abandonados. Então, nesse aspecto, um câmbio depreciado é favorável para a indústria. É claro que o câmbio não responde por tudo, eu preciso ter uma baixa volatilidade [cambial]. Além disso, para ganhar mercado eu preciso aumentar minha capacidade produtiva, ou seja, eu preciso de financiamentos, artigo muito escasso no Brasil de hoje. Não só está escasso, mas, principalmente, está num custo que não é compatível com o retorno.

MF: Em contrapartida, ao comprar localmente, os juros exacerbados não dificultam o financiamento da indústria local?
MB: Se eu ganho 8% [sobre o produto] e o custo do financiamento é 20%, eu não posso baixar meu preço, se não eu quebro. Então, o setor bancário e o setor financeiro não cumprem o papel que lhes cabe em qualquer país que é alavancar a produção, ele está servindo praticamente para quem tem dinheiro, não para quem não tem. Quem tem dinheiro coloca lá e ganha dinheiro. E quem não tem e quer produzir – quem quer empréstimo –, o que o banco faz? Ele toma uma parte do meu patrimônio, e não do meu resultado. Isso é gravíssimo, isso mata os investimentos.

MF: Então, como recuperar isso junto à indústria local?
MB: Precisava haver um ambiente econômico um pouco mais estabilizado. É claro que isso pressupõe também uma solução num acondicionamento da crise política. […] Então, o governo deve ir atrás das medidas necessárias para que os financiamentos voltem a fluir, para que o câmbio fique um pouco mais estável e aí da para fazer política que hoje é impossível. Com esse pano de fundo, as empresas pensam mais em sobrevivência do que qualquer outra coisa.

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MF: De que maneira, em contrapartida, isso afeta no produto final, para empresas que necessitam importar peças e componentes do exterior?

MB: Elas não são muito afetadas, mas acabam sendo afetadas sim. Os insumos/componentes e a matéria- -prima que compõem uma máquina representam, grosso modo, metade do preço final. Se você imaginar que metade desse mercado é importada, o u s e j a , i m p o r t a m o s m e t a d e dos componentes que usamos – supostamente – então 25% do meu preço depende do câmbio. Se o câmbio dobra, esse 25% dobra, portanto eu aumento meu custo em 25 pontos percentuais. O que antes eu vendia por R$ 100,00, hoje eu venderia a R$125,00. Aí você diria: Então o câmbio me prejudica? Não, porque o meu concorrente que antes vendia por R$ 100,00, hoje tem que vender por R$ 200,00 para receber o mesmo. Portanto, eu ganho espaço no mercado interno.

MF: Há um ano, eu entrevistei um diretor da Abimaq que disse que a tendência do fabricante local para sair da crise era a exportação. Gostaria que você me dissesse se essa tendência se concretizou em resultados positivos e quais as regiões que mais favoreceram esse movimento.

MB: A exportação pressupõe algumas coisas: pressupõe que eu tenha uma certa garantia de que o câmbio não vai despencar de novo, o que eu não tenho; ninguém compra máquina à vista, nem no Brasil, muito menos lá fora, a máquina é financiada e com seu resultado precisa pagar financiamento. Então, é preciso um câmbio estável e financiamento para exportação, o que não existe, o governo cortou. Então isso retarda o efeito que a exportação pode ter no setor. Não é que não vai ter, vai ter, mas ao invés de ter uma resposta mais rápida vai ter uma resposta mais lenta. Habitualmente, se as condições fossem todas favoráveis, as respostas seriam esperadas dentro de um ano. […] Sem essas condições, eu tenho que pensar dois ou três anos, esperando que as condições melhorem. Portanto, a exportação vai sim ajudar o setor. Os setores que possuem maior consumo respondem mais rapidamente, creio que no começo do ano que vem, mais fortemente em meados do ano que vem. Penso num uptime de um ano e meio a dois anos para uma mudança no câmbio.

“Com esse pano de fundo, as empresas pensam mais em sobrevivência do que qualquer outra coisa”, diretor de competitividade da Abimaq, Mario Bernardini.

MF: Já é possível sentir algum efeito da exportação e que setor pode se beneficiar mais com essa tendência?
MB: A não ser alguns casos específicos, alguns setores, mas a princípio não. Mas no faturamento do setor, resultados ainda não são sentidos.

MF: Chegando ao fim do ano, nesse sentido, qual a perspectiva para o próximo ano?
MB: Há expectativas, mas efeitos ainda não. Os fabricantes nacionais estão com capacidade ociosa grande, portanto eles terão que ter certeza que terão mais vendas e mais mercado e depois irão pensar, naturalmente, em novos investimentos e inovação. Mas não há ambiente nenhum para isso, somente perspectivas. O drama é que ninguém está comprando máquina no Brasil.

MF: Esse cenário de incertezas tem feito os empresários estagnarem investimentos em pesquisa e desenvolvimento?
MB: Em 2014, os investimentos já caíram fortemente. Ano passado, em máquinas, nós vendemos 12% a menos e, esse ano, venderemos 15% a menos e a importação vai cair 20%; então, ninguém está comprando máquinas. [Segundo Sondagem de Investimentos da Fundação Getúlio Vargas (FGV), a intenção de investimento na indústria aumentou no terceiro trimestre desse ano, porém a alta foi pequena e ainda há mais empresas querendo diminuir os investimentos do que aumentá-los. No terceiro trimestre desse ano, 19% das empresas previram investir mais nos 12 meses seguintes, e 33% previram investir menos].

MF: Neste cenário, qual a expectativa da Abimaq em relação a 2016?
MB: Esperar 2017. Não há grandes expectativas, realmente não há. Se nos dois meses que faltam solucionarmos a situação política sem grandes sobressaltos; se as empresas envolvidas na operação Lava Jato fizerem uma solução de quem vai para a cadeia e quem não vai; se o governo conseguir equacionar minimamente a situação fiscal e ter condições de abaixar um pouco os juros; enfim, só assim alguns nichos de investimentos, no segundo semestre, teriam um ambiente melhor. Mas resultados, efetivamente – eu não estou brincando quando falo –, somente em 2017.

Presidente da Abimei – Ennio Crispino

MF: De que maneira a subida histórica do dólar nos últimos meses, tangenciado R$ 4,00, afetou as importadoras de máquinas e equipamentos?

EC: A subida do dólar trouxe uma redução acentuada no nível de negócios dos importadores de máquinas e equipamentos, já que há a incerteza sobre a variação cambial entre o momento da compra até o recebimento do equipamento importado. Esta incerteza é o principal motivo na redução no nível de negócios.

MF: Houve uma tendência de mudança na origem dos pedidos, por exemplo, empresas que deixaram de comprar produtos – peças, componentes, máquinas ou equipamentos – da Europa ou Estados Unidos e passaram a importar de empresas asiáticas ou latino- -americanas, buscando similares com valores reduzidos do que estavam habituados a comprar?

EC: O que notamos é um aumento na importação de peças de reposição para máquinas importadas já existentes. As empresas estão, pelo menos, querendo manter os equipamentos em condições de operação e de funcionamento. Por outro lado, os empresários que procuram soluções de alta tecnologia, independente da questão do câmbio, continuam procurando opções de equipamentos de primeira linha, sejam eles provenientes da Europa ou da Ásia.

MF: Que saída os importadores de máquinas estão vendo para manter o faturamento?
EC: Neste momento, temos que ser realistas: será muito difícil manter o mesmo nível de faturamento de anos anteriores. Mas uma forma de atenuar essa redução é oferecer serviços de que o importador possa dispor, como assistência técnica e manutenção programada/preventiva. São serviços agregados que compensam, até certo ponto, a queda na venda de máquinas. No entanto, nem isso tem sido capaz de reverter a queda no faturamento.

MF: Que ações e estratégias a Associação e os associados têm tomado para manter o ânimo do empresário local para continuar a investir em máquinas importadas e de alta tecnologia?

EC: A ênfase do nosso discurso tem sido em alertar o empresário, o associado, de que nesses momentos de reduzidas oportunidades de venda, eles devem destacar a maior produtividade e e f i c iênc ia do equipamento importado que eles oferecem, já que os usuários finais, os clientes, estão buscando soluções que deem maior competitividade, justamente para competir nesta crise. Por isso, vemos que o importador tem que destacar o quanto essas máquinas podem ser produtivas para tornar o cliente mais competitivo no mercado.

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MF: O cenário econômico tem afetado a mão de obra do setor? EC: Sim, com certeza. Mesmo a mão de obra especializada tem sido prejudicada, já que as empresas – e os importadores também –, no momento, passam por redução nos seus quadros de pessoal devido à baixa demanda que estamos presenciando.

“O que notamos é um aumento na importação de peças de reposição para máquinas importadas já existentes. As empresas estão, pelo menos, querendo manter os equipamentos em condições de operação e de funcionamento”, presidente da Abimei, Ennio Crispino.

MF: Qual a perspectiva para o próximo ano?
EC: Neste momento, é muito difícil esperar um quadro para 2016 que seja mais alentador do que foi este ano. É quase impossível, agora, dizer quando haverá o ponto de inflexão em que a atividade industrial voltará a crescer. Acredito que, dificilmente, isso poderá ocorrer ainda em 2016. Não há indícios que nos deem a confiança de dizer que o ano que vem será melhor que 2015. Nossa expectativa mais otimista é de que 2016 não seja pior que 2015, que mostre uma melhora, especialmente no setor automotivo, sempre o grande impulsionador dos investimentos na área de bens de capital.

Aqui, é importante ressaltar o papel das exportações nesse cenário de eventual recuperação. As poucas oportunidades de negócio que têm aparecido geralmente dizem respeito a empresas que precisam melhorar a competitividade com vistas à exportação, aproveitando o momento favorável do câmbio. No entanto, isso só é possível se essa empresa já tiver desenvolvido a atividade de exportação de alguns anos para cá. Estar apto pra exportar não é algo que se consegue do dia para a noite. A empresa tem que ter ido a outros mercados, fazer contatos e mostrar a qualidade dos produtos que ela oferece.

MF: De que maneira as matrizes estrangeiras têm reagido aos resultados do mercado brasileiro?
EC: Elas têm olhado o mercado brasileiro com muita apreensão e, assim como ocorre com a indústria nacional, procurado “sobreviver” a esse cenário muito difícil. Como consequência, há o adiamento de planos de expansão que pudessem ter para sua atuação no Brasil. Acreditamos que esses planos somente voltarão à pauta quando o cenário econômico por aqui for bem diferente do que se apresenta hoje.

MF: Você poderia nos passar um panorama dos principais mercados externos? De que maneira a crise global e outras regiões têm afetado o mercado de importação brasileiro?
EC: Os poucos interessados em investir em tecnologia, no Brasil, gostariam de aproveitar oportunidades em que o fabricante estrangeiro oferecesse preços altamente competitivos. Se esses fabricantes têm algum estoque no Brasil que precisa ser vendido, isso acontece. Há, realmente, ótimas ofertas de equipamentos importados, já no Brasil, em estoque. Mas quando falamos de máquinas fabricadas sob encomenda, os preços são internacionais. O fabricante estrangeiro não vai oferecer um preço diferenciado para o comprador do Brasil só por causa da crise. Afinal, ele pode vender a mesma máquina no preço mais lucrativo para um mercado com um bom ritmo de negócios.

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