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O "Poetinha" É digno reverenciá-lo!

“Quem já passou por essa vida e não viveu Pode ser mais, mas sabe menos do que eu Porque a vida só se dá pra quem se deu Pra quem amou, pra quem chorou, pra quem sofreu”.

Marcus Vinicius da Cruz de Mello Moraes, ou, simplesmente, Vinicius de Moraes, tem em 2013 a comemoração de seu centenário. Diplomata de profissão (afastado pelo AI-5), esse compositor, poeta, jornalista, cronista, dramaturgo e crítico de cinema teve na elegância e na profundidade de sua obra grandes marcas.

Artista reverenciado, amigo de Drummond e Pixinguinha, viveu durante o período turbulento das duas guerras mundiais. De coração grande e de amor maior ainda, ao desfilar sua abrangente e madura arte ante nossos olhos e ouvidos, qualificou de forma singular e estabeleceu, simplesmente, o antes e o depois na história da música popular brasileira.

Suas parcerias com grandes músicos e compositores – como: Tom Jobim, Baden Powell, Chico Buarque, Dorival Caymmi, Toquinho, Pixinguinha, Ary Barroso, Francis Hime, Carlos Lyra – entre gravações e regravações –, transitam pelos quatro cantos do planeta.

Sem se apegar a rótulos, Vinicius consagrou a Bossa Nova para, em seguida, se misturar aos afro-sambas de Baden, às múltiplas variações criativas de Jobim, desembocando, também, em canções infantis.

Garota de Ipanema, se, para muitos, não é sua obra mais importante, tem o mérito de ter sido, durante alguns anos, a segunda canção mais executada no planeta. Fato que gerou célebre argumento de Tom Jobim: “Perdemos para os Beatles, mas eles eram quatro!” aludindo à primeira canção mais executada no planeta: Yesterday.

O “Poetinha” – como é carinhosamente chamado – transitou pelo teatro e pelo cinema. Nesses palcos, também teve uma produção premiada e respeitada. Através da peça Orfeu da Conceição – adaptado para as telas no filme Orfeu Negro – trouxe à tona fortíssimo tabu social: o preconceito. O texto é uma adaptação do mito grego de Orfeu para a realidade das favelas cariocas. Esse musical marca o início da célebre parceria com Antônio Carlos Jobim e traz consigo o traço da democracia, da igualdade, do grito – não forjado – contra a discriminação racial. Sem ser nas entrelinhas, o negro e o morro ganham destaque.a

Vinicius, o homem dos romances e de alguns casamentos, embalou histórias de amor. Sua obra fortaleceu encontros e inspirou paixões. A partir de “O caminho para a distância” – seu 1º livro, lançado em 1933 – tornou-se um dos poetas brasileiros mais traduzidos no exterior. Seu caminho muito bem percorrido nos brinda com sucessos que se eternizaram e enfeitam nossas vidas. “Eu sei que vou te amar, Pela luz dos olhos teus, Coisa mais linda, Minha namorada, Lamentos, Rosa de Hiroshima, Samba em prelúdio, Regra três, Insensatez, Brigas, nunca mais, Samba da benção e Berimbau, são alguns desses presentes.

Além das canções que uniram casais, o Poetinha proporcionou a satisfação de pais e avós ao ninarem ou divertirem filhos e netos através das trilhas infantis criadas com Toquinho. Em tempos de um comércio musical de qualidade, no mínimo, questionável, felizes são os que podem desfrutar de canções profundas e sutis como Aquarela (obra original de Toquinho com os italianos Maurizio Fabrizio e Guido Morra – tradução para o português de Vinicius e Toquinho):

“Numa folha qualquer eu desenho um sol amarelo
E com cinco ou seis retas é fácil fazer um castelo (…)
Se um pinguinho de tinta cai num pedacinho azul do papel
Num instante imagino uma linda gaivota a voar no céu”
Ou, então, através da alegre e despojada
“O pato”:
“Lá vem o pato pata aqui pata acolá Lá vem o pato para ver o que é que há”.

Voltando um pouco no tempo, em 1958, ocorreu a gravação do importante disco: Canção do amor demais – da grande intéreprete Elisete Cardoso.

Mas o grande destaque, chega em 1959, com o LP Chega de saudade. Considerado um marco na música brasileira, o álbum de João Gilberto, traz a gravação desse esplêndido tema que dá nome ao disco e que, na opinião de grandes músicos e compositores das últimas décadas, revolucionou a música pátria. No documentário “Vinicius”, depoimentos de Edu Lobo, Chico Buarque, Gilberto Gil e Caetano Veloso evidenciam essa realidade. Todos enfatizam o quanto aquilo era novo e genial. “Eu estava em Recife e fiquei completamente paralisado” – comenta Edu Lobo. Gil diz: “Chega de saudade mudou minha vida.”

Essa maravilha – de harmonia, ritmo e letra irretocáveis – merece destaque:

“Mas se ela voltar, se ela voltar Que coisa linda, que coisa louca Pois há menos peixinhos a nadar no mar Do que os beijinhos que darei em sua boca”. Hoje, talvez, muitos de seus admiradores dirão o mesmo que disse Drummond em certa feita: “Eu queria ter sido Vinicius de Moraes”.

Além da linda obra, provavelmente o grande feito de Vinicius, a sua grande mensagem, tenha sido a busca incessante pela felicidade.

“Eu poderia suportar, embora não sem dor, que tivessem morrido todos os meus amores, mas enlouqueceria se morressem todos os meus amigos!”

Quem tem acesso às criações desse grande poeta certamente é mais feliz, ou, aproveitando o ensejo poético, é, ao menos, menos triste.



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