Considerações sobre a obtenção de êxito na usinagem de metais
Há muito se escreve sobre a usinagem de metais. O objetivo desse artigo, no entanto, é repassar algumas considerações que possam contribuir para o sucesso nesse tipo de atividade.
É comum que, os mais leigos no assunto, não se atentem a todos os quesitos necessários à obtenção da máxima produtividade sob o mínimo custo em operações de usinagem. Muitos se apegam ao que lhes é naturalmente mais visível como o RPM, – número de rotações por minuto – que uma máquina proporciona. Porém, esse é apenas um dos fatores a serem considerados. No máximo, podemos dizer que o RPM pode ser um ponto de partida.
No caso de usinagem de moldes e matrizes, por exemplo, muitas vezes se aplica o conceito de HSM – High Speed Cutting, no qual o êxito depende de uma convergência de tecnologias e estratégias de corte para que se obtenha ganhos significativos nos tempos de produção, pois o custo final e o prazo de entrega de um molde ou de uma matriz é fundamental nesse segmento de mercado.
Ainda que muitas empresas possam produzir moldes e matrizes, de modo eficaz, por meio de processos de usinagem mais convencionais, a prática do HSM tem ocupado cada vez mais espaço na indústria (dado os benefícios que proporciona) por eliminar etapas de produção, uma vez que permite usinar moldes já tratados termicamente, ou seja, já endurecidos. Trabalhando com velocidades de corte muito mais elevadas e mantendo fixa a espessura média dos cavacos, ao longo de todo o processo de usinagem geram muito menos tensões residuais, contribuindo assim para uma vida útil mais longa dos produtos usinados.
É verdade que a usinagem em si é apenas um dos aspectos a serem considerados para o sucesso da indústria da manufatura. Como se sabe, a boa gestão de vendas, o controle de custos, a administração financeira, a capacitação e a motivação dos funcionários (entre outros fatores) também são fundamentais para o êxito de uma empresa como um todo.
O QUE LEVA UMA EMPRESA A ADQUIRIR UMA MÁQUINA HSM?
As indústrias, dentro de seus segmentos, encontram desafios diferentes com respeito aos materiais a serem usinados, complexidade de peças, lotes etc. Cada uma opta por tecnologias diferentes para resolver problemas que, algumas vezes, são muito semelhantes. O motivo dessas divergências se deve, invariavelmente, ao nível de conhecimento e aculturamento técnico dos departamentos responsáveis pela manufatura, em cada distinta empresa.
Ao dialogar com pessoas de uma empresa que adquiriu uma máquina HSM, pudemos observar que os objetivos finais coincidiam, mas as expectativas e as impressões eram diferentes. Os gestores comerciais esperavam reduzir prazos de entrega e baratear custos, para serem mais competitivos em preços, a fim de alavancar vendas e deslocar a concorrência. Os chefes de produção contavam com a otimização do balanceamento da carga de máquinas, menos refugos, maior confiabilidade dos processos, agilização da fabricação de protótipos e trabalhar com campos de tolerâncias dimensionais menores. Os administradores financeiros tinham a expectativa de um melhor retorno sobre o investimento e assim por diante.
Para a supervisão de produção, a possibilidade de usinar endurecidos significava obter durabilidade maior dos moldes, redução ou eliminação de etapas nos processos de eletroerosão e acabamentos superficiais melhores. Os operadores de máquina pouco sabiam sobre esse novo conceito de usinagem; as velocidades aplicadas, os ganhos em qualidade superficial, a redução nos tempos de eletroerosão surpreenderam bastante. Os programadores CNC (Comando Numérico Computadorizado), no entanto, sentiram a necessidade de ampliação de seus conhecimentos sobre estratégias de programação para que pudessem maximizar a utilização do potencial total tanto da máquina, quanto das ferramentas de última geração, voltadas às operações em HSM.
Apesar de tantas expectativas, do ponto de vista da manufatura, o que mais importa é produzir moldes e matrizes de forma cada vez mais rápida e com tolerâncias mais estreitas, independentemente da complexidade que possam ter; sendo ideal que se execute todas as operações de usinagem em uma única fixação e, sempre que possível, racionalizando os processos, garantindo maior precisão, eliminando operações de pressetting de ferramentas e preparações de máquinas. Para tanto, tais máquinas, em sua maioria, são de 5 eixos programáveis. Isso implica em cálculos e programações que exigem do programador um nível técnico mais elevado tanto do ponto de vista dos cálculos geométricos, quanto do conhecimento de ferramentas, máquinas, materiais, fluidos refrigerantes e estratégias de programação CNC. Encontrar um profissional com todo esse gabarito, atualmente, é quase como encontrar, no quintal de casa, uma mosca branca de olhos azuis.
Para obter-se o melhor ciclo de produção, é essencial que todo o pessoal envolvido tenha noções claras e definidas dos recursos disponíveis e das potencialidades existentes em termos de máquinas, ferramentas e demais tecnologias.
Presentemente, é imprescindível que se busque altos níveis de competitividade. Não há como fugir dos efeitos da globalização, pois mesmo que a empresa decida competir apenas localmente, todos os clientes são globais e acessam diariamente informações de todas as partes do mundo e, raramente, decidirão uma compra sem antes pesquisar o mercado externo. Ou você se alinha com o que há de melhor no mundo ou ficará à margem do mercado.
Marco Antônio Ornaghi, especialista em usinagem, em artigo publicado no livro “Usinagem em Altíssimas Velocidades” – editora Erica, à página 179, apresenta um relato de um profissional responsável pela área técnica de uma empresa produtora de moldes, que trabalha com máquinas de HSM, enfatizando o grau de concorrência e a competividade necessária para se conquistar ou manter espaço no mercado: “Para a nossa empresa, a meta é competir dentro do Brasil, oferecendo prazos e entrega que empresas concorrentes não conseguem atender. A falta de agilidade leva muitas vezes nossos clientes a buscar fornecedores fora do País”. Resultado das facilidades logísticas, o fato é que “moldes podem ser entregues por fabricantes de outros países em até 30 dias; os mais complexos em 45 a 60 dias. Como temos equipamentos iguais ou melhores que a concorrência, podemos oferecer a prazos de entregas mais estreitos e isso se torna um diferencial competitivo. A qualidade, obviamente, terá de ser, no mínimo, equivalente à da concorrência”.
Apesar da lenta recuperação do mercado, percebida em alguns poucos seguimentos de mercado, algumas empresas começam a analisar a possibilidade de retomar os investimentos em máquinas. Os dirigentes industriais mais temerosos, preferem continuar aguardando uma retomada mais acentuada. O desafio, no entanto, envolve mais do que decidir a compra da máquina. Envolve também elaborar um processo de usinagem suficientemente competitivo, a fim de se garantir o melhor retorno sobre o investimento.
ALGUNS PRÉ-REQUISITOS PARA A MAXIMIZAÇÃO DA PRODUTIVIDADE EM USINAGEM
A máxima produtividade em usinagem depende da perfeita adequação dos processos de manufatura, levando-se em conta a escolha correta das ferramentas, considerando geometrias, parâmetros de corte, classes de metal duro, sistemas de fixação, estratégias de percurso de ferramenta, em função das possibilidades dos softwares de programação etc. Tudo isso, tendo em vista o conjunto máquina x ferramenta x peça, orientando todas as decisões em função das expectativas e necessidades de custos e produtividade.
Ornaghi, ainda no mesmo artigo já mencionado, relata outro depoimento de usuário de HSM: “Havia muito cuidado para se colocar a máquina em operação. Na entrega da máquina, nos foi ensinado o básico, contudo, com o tempo, dúvidas foram surgindo. Pensávamos que iríamos trabalhar, de imediato, nos limites da máquina, algo em torno de 24.000 rpm e 36.000 mm/min avanço. A ideia era atingir o desempenho máximo de saída, porém logo percebemos que há limites que impedem tal procedimento.
Entendemos que, dadas as nossas circunstâncias, era adequado não operarmos com avanços maiores que 8000 mm/minuto. Percebemos que havia limitações da interface máquina/ferramenta. Em aços temperados, conseguimos operar com velocidade de corte em torno de 300 mm/ min, para fresas inteiriças de metal duro. Para ferramentas com pastilhas intercambiáveis, as velocidades não superaram os 240 mm/min. O que achamos pouco”. Pelo comentário, percebe-se uma certa frustração, provavelmente causada pelas expectativas demasiadamente elevadas.
Ao implementar tecnologias como a HSM, deve-se estar preparado para mudanças conceituais quanto aos processos. O desafio é que as alterações a serem feitas fogem das considerações convencionais. Muitas vezes implicam em uma adaptação da cultura técnica da empresa, o que pode ser notado em mais esse comentário de usuário que Marco Ornaghi nos traz.
“Realizamos os desbastes em máquinas convencionais, seguido do tratamento térmico e retificação para esquadrejamento. A HSM usamos apenas para acabamentos e fechamento do molde”. Outro diz: “Devido às características do produto, realmente pensamos em tratar termicamente o material e depois usinar em HSM. Porém, agora estamos testando um material recomendado por determinado fabricante de aços sem a necessidade de se tratar termicamente. O desbaste e o acabamento são realizados em HSM”.
AS FERRAMENTAS DE CORTE: QUALIDADE E PREÇO
Há, no mercado, ferramentas de corte de variados níveis de qualidade e preços. Para determinadas aplicações, ferramentas de preço menor e qualidade inferior podem ser usadas sem muitas restrições. Entretanto, quando se trata de HSM, ferramentas inferiores, invariavelmente, não resistem às condições operacionais extremas, não oferecendo precisão e resistência aos desgastes suficientes, colocando em risco não só a qualidade do produto final, mas também a segurança da máquina e a do operador.
O depoimento de um outro usuário nos deixa bem claro. “A qualidade das ferramentas passa, agora, a ser um fator primordial da escolha, principalmente de fresas inteiriças de metal duro. Detalhes como a classe de tolerância dimensional das fresas influenciam a precisão das operações de acabamento, na qual a concordância de superfícies é fundamental. A má concordância evidencia saliências, que devem ser eliminadas ou minimizadas por meio da constante correção do diâmetro da fresa ou pelo sobremetal e espessura média do cavaco calculados durante a programação. Outra alternativa seria realizar retrabalhos de correção na própria máquina. Porém, essa opção é menos produtiva, quando não, inviável.”
Reduzir custos é crucial para ser mais competitivo, porém é imprescindível que não se comprometa a produtividade. Quanto menos tempos improdutivos, melhor. Deve-se evitar, sempre que possível, qualquer parada de máquina. Para isso, quanto mais longa a vida de ferramenta, que suporte condições operacionais extremas, mais se estará no caminho da competitividade. É necessário analisar o custo total da usinagem e não somente o preço da ferramenta.
Assim sendo, a escolha do fornecedor de ferramentas deve ser extremamente criteriosa. Além de verificar históricos de fornecimento e o desempenho das ferramentas, é necessário analisar a capacidade técnica e os serviços prestados pelo mesmo. Sabe-se que o estabelecimento de um bom relacionamento técnico-comercial contribui para uma implementação de HSM bem-sucedida. Bons fornecedores de ferramentas de corte têm na usinagem o seu core business, e acumulam ampla experiência na implementação e tryout de máquinas e processos. Por esse motivo, podem agregar conhecimento na implementação de novos conceitos de manufatura. O usuário vai obtendo maiores ganhos em competitividade à medida que estreita esse tipo de relacionamento. Quanto mais profissional e mais inteirado dos desafios dos clientes, mais o bom fornecedor poderá contribuir quanto à otimização da produtividade em usinagem.
A SELEÇÃO DAS FERRAMENTAS
Para ser bem-sucedido na utilização da tecnologia HSM, é fundamental que o usuário selecione a ferramenta correta para cada operação em particular, pois a ferramenta só pode ter uma boa performance se for aplicada de acordo com a finalidade para a qual foi projetada.
É comum haver um estresse inicial dos operadores desafiados a “colocar uma máquina nova para trabalhar”. Há várias ferramentas para escolher, classes do metal duro, geometrias, sistemas de fixação etc. O fornecedor de ferramentas pode utilizar sua experiência e recursos para auxiliar o cliente. Os depoimentos seguintes de alguns usuários explicam.
“Melhorias importantes foram realizadas na medida em que fomos ampliando o conhecimento sobre o leque de ferramentas disponíveis no mercado e fomos sendo orientados pelos fornecedores. A ideia de utilizar fresas inteiriças de metal duro de três cortes – substituindo a de dois cortes, no acabamento de uma cavidade – resultou em ganhos de até 50% no avanço. Ainda substituímos as fresas de topo reto com canto vivo pelas toroidais. Em vez de usar fresa de 2 mm de diâmetro, topo reto de dois cortes a 23.000 rpm e avanço de 900 mm/min, passamos a usar fresa toroidal (raio de 0,5 mm) com quatro cortes a 24.000 rpm e avanço de 5.670 mm/min, devido a maior estabilidade do conjunto. As velocidades de corte passaram de 160 m/min para 300 m/min. Outro aspecto foi calcularmos os dados de corte em fresas intercambiáveis, considerando a espessura média dos cavacos. O que também gerou ganhos significativos no avanço da máquina”, afirmou um usuário.
Outro usuário comentou: “Foi possível reduzir pela metade o tempo de desbaste de uma cavidade, à medida que observamos o cálculo do diâmetro efetivo de corte de uma fresa toroidal de 12 mm, o que resultou em maiores velocidades de corte e avanço”.
LITERATURA TÉCNICA E TREINAMENTO
Novas ferramentas e tecnologias, estratégias de usinagem, cálculos mais apurados dos dados de corte são fundamentais em qualquer tipo de usinagem e são mais ainda em usinagem HSM. O fornecedor de ferramentas pode auxiliar o usuário, provendo-o de materiais técnicos, catálogos, softwares e programas específicos de treinamento. Operadores e técnicos devem ter plenas condições de especificar ferramentas e calcular os dados de corte com as devidas compensações necessárias. Isso irá refletir diretamente nos tempos e custos da usinagem e na resolução de problemas.
Em treinamento, um usuário identificou o motivo da quebra de suas fresas de metal duro. A quebra ocorria devido ao uso de sistema de fixação inadequado para altíssimas velocidades. “Agora que estamos mais atentos, percebemos que ainda existem ferramentas no mercado, cujas informações fornecidas não condizem com a realidade. É importante termos informações confiáveis”.
Marco Ornaghi reforça que, em HSM, é preciso analisar o processo como um todo: máquina, estratégias de programação, métodos de usinagem, ferramentas e recursos humanos. O que se busca é o melhor ciclo de produção possível. Para que isso ocorra, é essencial que todo o pessoal envolvido com o processo de fabricação tenha noções claras e definidas dos recursos disponíveis e das potencialidades existentes em termos de máquinas, ferramentas e demais tecnologias, para que se obtenha os melhores resultados tanto nos processos convencionais, quanto nos mais avançados, como os encontrados nos novos conceitos de produção como na manufatura da indústria 4.0.
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