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A importância da linguagem corporal no meio corporativo

Uma camisa passada, um toque sutil, o posicionamento de uma cadeira, a postura e várias outras técnicas não verbais podem colaborar na sua negociação. A observação e a disciplina permitirão que você se sinta mais confiante – de forma consciente ou inconsciente –, o que resultará em uma venda mais eficaz. Com a chegada das feiras de negócios e a aproximação física com o cliente, é importante vigiarmos nossas atitudes, especialmente durante esses eventos, pois tomadas de decisão podem ser influenciadas também por atitudes não verbais. Não basta saber a técnica, é necessário acreditar nela e incorporar a linguagem não verbal no seu dia a dia para adquirir melhores resultados.

Veja na íntegra a entrevista que a Manufatura em Foco fez com o grafólogo, escritor e especialista em linguagem não verbal Paulo Sergio de Camargo.

“A linguagem corporal serve tanto para entender o outro, como também para influenciar o outro. É uma forma de alavancar o seu potencial.”

Manufatura em Foco: Qual a importância da linguagem corporal no meio corporativo? O que ela pode nos dizer?
Paulo Sergio de Camargo: Sempre que duas pessoas estão se relacionando, ou várias pessoas, em média – em uma média baixa – 65% das mensagens são corporais e 35% das mensagens são verbais. Se você aprender [a linguagem corporal], dobra as mensagens corporais em relação à mensagem verbal. Então fica muito mais fácil você entender a linguagem corporal da pessoa para você se relacionar.

Existe uma coisa que se chama paralinguagem, ou metalinguagem, que você diz o contrário do que você está dizendo. Vamos explicar: uma criança quebra uma coisa e você diz “nossa, que inteligente você fazer isso, né?”. Você está querendo dizer exatamente o quê? O contrário! Às vezes, na entonação da voz você carrega uma carga de emoção muito maior do que aparenta. [Para embasar] tudo isso existem pesquisas científicas, que na hora que a pessoa está falando, se ela consegue carregar mais emoção na voz, a mensagem é passada com muito mais intensidade e com muito mais clareza. E com base nisso, essas técnicas estão chegando ao Brasil. [Na verdade,] já chegaram ao Brasil há muito tempo, mas agora que o meio corporativo as está utilizando mais. Para vendedores, para pessoas de contatos, existem técnicas extremamente simples por meio das quais as pessoas conseguem aumentar tanto a venda como a aprovação.

MemF: Que técnicas seriam essas?
PSC: Uma dessas técnicas, que já é usada pela Apple, começou pela Applebee’s [rede de restaurantes dos Estados Unidos], e o Outback também usa: a garçonete quando chega perto de você para servir – e são pessoas jovens geralmente – se aproxima da mesa e, na hora que você vai fazer o pedido, ela se agacha e anota os pedidos agachada. Na hora que ela faz isso, ela diz [através da linguagem corporal]: “eu sou menor que você; eu me submeto a você”.

O cliente, na hora que pega o recibo, coloca a percentagem da gorjeta que ele quer dar para o atendente, certo? Eles [norte-americanos] fizeram uma pesquisa que mostra que, na hora que o atendente entrega o recibo ele toca os dedos, de forma imperceptível, de quem recebe, ou dá um toque na pessoa. Esse toque é chamado de “toque mágico”, porque aproxima a relação entre as pessoas. Os atendentes que dão o toque recebem gorjetas maiores do que os que não dão o toque.

MemF: Existem pesquisas sobre isso? PSC: Tem pesquisa sobre isso. Essas são algumas das técnicas. Técnicas para, por exemplo, a hora de cumprimentar com a mão. Somente na hora do cumprimento você já sabe se a pessoa quer dominar ou não a relação.

Na hora de cumprimentar as pessoas, se você quiser dominar a relação, você cumprimenta e vira um pouco a mão da pessoa para baixo. Essas pessoas dominam a relação e conseguem, se são vendedores, maior convencimento. Porque na hora que você coloca a palma da mão [da outra pessoa] pra cima, o cérebro dela fica predisposto a receber. E ao mesmo tempo que a pessoa cumprimenta com a mão direita, ela, quase que imperceptivelmente, dá um toquinho com a mão esquerda. Esse toque também aproxima muito mais as pessoas, e o relacionamento [entre elas] se torna mais fácil.

MemF: Qual é a ordem do processo, as técnicas foram criadas e depois aplicadas, ou surgiram a partir de práticas espontâneas e depois estudadas?
PSC: A linguagem corporal trabalha muito com a psicologia evolutiva. Nossos ancestrais, quando estavam nas savanas africanas, foram criando mecanismos para sobreviver e nosso corpo foi se adaptando ao longo dos anos, de modo intuitivo. O primeiro a perceber isso e escrever um livro foi Darwin. Ele comparou as expressões humanas com as expressões dos animais e observou que algumas são comuns tanto nos animais como nos homens.

Mas isso ficou latente até que, nas décadas de 1940 e 1960, apareceu um psicólogo americano chamado Paul Ekman. Ele resolveu provar isso de modo científico. Então ele “criou” o que chamam de expressões primárias. Nós já nascemos com algumas dessas expressões, independentemente da cultura. […] Além das provas científicas, ele percebeu o seguinte: uma criança que nasce cega em São Paulo tem as mesmas faces de nojo, alegria, tristeza e medo de uma criança que nasce cega na China. Existem dezenas e centenas de estudos científicos provando isso. Ele e outros autores fizeram uma coisa mais interessante: provaram que muitas vezes essas expressões são bem visíveis, mas, às vezes, como nós nos socializamos e conseguimos controlar [algumas expressões], só aparecem na nossa face microexpressões. Você pode fazer uma microexpressão de nojo que dura um quarto de segundo que, às vezes, a pessoa só pode ver passando o filme em câmera lenta. Por exemplo, raiva: o seu chefe chega para você e começa a falar algumas bobagens. Você fica com raiva dele, mas você não pode fazer aquela cara de quem está com raiva. Então as pessoas fazem microexpressões de raiva, de alegria, de tristeza etc. Uma microexpressão de raiva é, por exemplo, afinar os lábios. Apertar e afinar os lábios é um sinal de raiva contida. Então você consegue ver e consegue interpretar essas expressões. Isso te dá uma vantagem muito grande.

[…] Quando você começa a estudar a linguagem corporal, você pode reconhecer a microexpressão de tristeza. Aparece uma ruga vertical entre as sobrancelhas. Se eu estou dizendo alguma coisa para você e aparece essa ruga vertical, significa que o que eu estou falando causa dificuldade em você; essa é a chamada “ruga de dificuldade”. Se você está falando alguma coisa para mim e aparece essa ruga, o que você está falando me causa dificuldade. Por exemplo, em uma negociação, em um relacionamento, na hora que você observar uma pessoa e vir a ruga da dificuldade você pode trabalhar em cima disso com muita facilidade. Essa e outras dezenas de expressões você aprende como se elas fossem, vamos dizer assim, uma língua.

“Na hora que eu coloco as duas mãos na mesa eu estou dominando o território.” incorporar isso. Por exemplo: o gesto de

MemF: Você acredita que o bom vendedor e o bom líder têm como característica observar essa linguagem para poder interpretar e tomar atitudes a partir disso?

PSC: O que acontece no Brasil é o seguinte: muitas pessoas, muitos vendedores e muitos líderes têm algumas posturas de modo intuitivo. Mas quando você começa a ensinar [ao vendedor] as técnicas, ele pode potencializar e muito a venda. Por exemplo, o olhar: na hora que o cliente entrar na loja ele tem que fazer o chamado “olhar profissional”. O olhar profissional consta em você olhar com os seus dois olhos paralelos aos do cliente, mirando um triângulo imaginário na testa [dele]. Durante os primeiros segundos que você faz isso, a conversa se torna uma coisa séria. Depois de alguns momentos, você olha paralelamente (dois olhos nos dois olhos) e [imagina] esse triângulo na boca – “o olhar afetivo” –, e então começa a negociar, [alternando] entre o olhar afetivo e o olhar profissional. Aí você tem mais facilidade de controlar o cliente.

[…] Se você entra na parte de liderança, por exemplo: a posição das mesas determina vários níveis de conversação. O líder sempre senta onde? Na cabeceira. Se é uma mesa retangular, comprida, se ele quiser trazer a pessoa para o lado dele, ele coloca a pessoa na primeira cadeira à direita. Se ele quiser isolar a pessoa em uma mesa retangular que, por exemplo, tenha dez cadeiras, ele vai colocar a pessoa à esquerda e na última cadeira. Outra coisa, para mostrar que ele é líder, na hora em que chega a uma reunião e está todo mundo sentado, ele coloca as duas mãos na mesa e fica durante 30/40 segundos dando as primeiras ordens com as mãos na mesa. A mensagem é clara: “quem manda aqui sou eu”. Na hora que eu coloco as duas mãos na mesa eu estou dominando o território.

MemF: Isso tem a ver com a hierarquia das comunicações? PSC: Exatamente. Ele vai hierarquizar as comunicações. Na hora que ele coloca as duas mãos na mesa e vai falar, ou na hora que vai falar no púlpito, quando vai fazer uma palestra, na hora que ele coloca as duas mãos na mesa, além da mensagem também aumenta – tanto no homem quanto na mulher – o nível de testosterona. […] Tem outras técnicas: Qual é a posição natural de a gente andar? É com a mão baixa e com o polegar apontado para baixo, não é isso? Para mostrar mais energia e mais vontade na hora de falar, eles [líderes] falam com as mãos na chamada “bola de basquete”. Tente pegar uma bola de basquete imaginária. Nessa bola de basquete, os dedos polegares ficam pra cima.

[…] Nessa e em outras técnicas d e l i d e r a n ç a , d e p o s t u r a , d e posicionamento, você pode treinar o vendedor, pode treinar o líder, e os resultados são extremamente eficientes. Isso também porque tem outros líderes, líderes naturais, que usam [algumas técnicas] de forma inconsciente. Mas hoje já se sabe que você pode, sim, treinar o líder nessas posturas. Embora no Brasil isso seja muito incipiente, nos Estados Unidos e na Europa o estudo da linguagem corporal já é considerado uma competência.

MemF: A nossa conversa começou com você falando que 65% da comunicação é feita de componentes não verbais. Porém, um número muito grande de vendas acontece no meio virtual, e nesse caso o contato pessoal com o cliente acaba sendo mínimo. Você acredita que uma mudança comportamental possa alterar essa porcentagem no futuro?

PSC: Isso aí é um dado que teríamos que trabalhar de modo científico. […] A tecnologia vai mudar as relações, e a gente não sabe até que ponto ou como vai influenciar. Mas a tecnologia, em termos de comunicação verbal, muda diariamente. […] Então, isso tudo influencia muito e ninguém sabe para onde isso vai [nos] levar, porque agora nós estamos na fase do iPhone. Eu falo que o iPhone já contaminou os adultos, antes era só os adolescentes que compravam e ficavam mexendo na internet, no celular. Hoje os adultos também fazem isso. Outro dia eu fiquei impressionado, eu estava em Congonhas [aeroporto na cidade de São Paulo] e no ônibus que me levou até o avião – ônibus lotado –, de 70% a 90% das pessoas estavam com a cabeça baixa teclando no celular. Esse comportamento dificulta muito a relação com os clientes.

MemF: Quando a gente fala sobre o meio político ou corporativo, sabemos que parte dele usa a linguagem corporal de maneira instintiva e parte, de maneira mecânica.
PSC: Exatamente.

MemF: Você acredita que, nesse contexto, seja necessário agir de forma mecânica para melhorar o desempenho da comunicação? Se sim, de que maneira? Isso não interfere na espontaneidade do indivíduo, principalmente na questão política, do relacionamento com os seus eleitores e na relação dos vendedores com os seus clientes?
PSC: Esse treinamento é um processo que leva bastante tempo. Então, por exemplo, andar com o queixo na horizontal é um processo que indica vitalidade e energia. É um processo que você tem que fazer todos os dias, precisa incorporar isso. Por exemplo: o gesto de conversar com as pessoas falando com a mão, com a palma da mão para fora ou com a “bola de basquete”, são gestos que você tem que incorporar, e vai demorar meses para isso [se tornar natural para você]. A pessoa incorpora aquilo e passa a ser uma coisa natural. É o mesmo que o treinamento de qualquer esporte: ela vai fazer treinamento e vai transformar aquela postura em algo extremamente natural.

“É o mesmo que o treinamento de qualquer esporte: a pessoa vai fazer treinamento e vai transformar aquela postura em algo extremamente natural.”

MemF: Como podemos identificar quando um locutor está mentindo?
PSC: Então, quando alguém mente tem um “lampejo” de ansiedade. Muitas vezes a pessoa diz uma coisa e o corpo diz outra. Por exemplo, um caso recente, você deve ter visto o Lula dizendo que ele se considera “o cara”, que não existe ninguém mais honesto que ele, certo?

Se você olha o vídeo e olha o queixo dele, ele fala “não existe ninguém mais honesto que eu”, o queixo dele diz o quê? Ele diz que é o mais honesto, mas a cabeça diz não. Entendeu? O [José] Dirceu, na CPI, diz que “o Delúbio [Soares] é um cara honesto”, a cabeça do Delúbio vai para lá e para cá, a do Dirceu vai para lá e para cá. A boca diz que é um cara honesto, mas o corpo, inconscientemente, tá dizendo o quê? [Que] não é honesto. Isso [esse procedimento] é usado não só por investigadores policiais, mas também em negociações.

MemF: E na venda de um produto, se o vendedor está falando de um produto em que ele não acredita e ele não consegue transmitir essa verdade através da linguagem corporal, ele pode estar fazendo uma tentativa ineficaz de venda?
PSC: Extremamente ineficaz. Antes eu brincava com vendedores: “Como é que você pode falar para mim uma coisa em que você não acredita? Esse sapato é totalmente de couro? [por exemplo]”. Quando um deles respondia “tenho certeza que é”, uma sobrancelha subia e a outra ficava no mesmo lugar. Era mentira, entendeu? Então fomos olhar a especificação [do sapato], era 60% de couro e o resto de plástico.

Então, na hora de negociar, na hora de observar as pessoas, se você sabe se a pessoa está mentindo ou não, você tem uma arma extremamente poderosa. […] E, de forma inconsciente, o vendedor que está mentindo não consegue passar credibilidade.

MemF: Você faz palestras separadas para gestores e colaboradores, certo? Com sua experiência, qual a principal dificuldade na comunicação não verbal do ponto de vista dos gestores e do ponto de vista dos colaboradores?
PSC: Existem, além dessas técnicas de linguagem corporal, algumas técnicas de convencimento. A maior dificuldade é o gestor visualizar que, primeiro, 65% é linguagem não verbal. Depois, visualizar que se você treinar a pessoa com essa técnica, ela vai sair pronta. Na hora que ela usar uma técnica de venda, o resultado será imediato.

Eu falo assim, em comparação, quando a pessoa faz palestras motivacionais. […] Tudo bem, vai aumentar a venda, mas três dias depois abaixou, acabou toda aquela motivação. Na linguagem corporal, se você incorporar isso [no] dia a dia, realmente os vendedores vão se aprimorando.

A linguagem corporal engloba tudo, roupas, cabelo etc. Engloba todo um sistema. Então, […] por exemplo, se eu quero mandar uma mensagem de que sou um executivo, eu passo a ter que usar ternos e gravatas. Tanto que, alguns anos atrás, no Rio de Janeiro, começou a haver uma série de assaltos a bancos, e os bandidos entravam com pasta de couro, cabelo arrumado, terno Armani para entrar e fazer o assalto. Aquilo convencia [ao transmitir] uma imagem de seriedade. O cara entrava com a arma no banco simplesmente pela postura, pelo alinhamento.

MemF: Você acredita que uma comunicação interna ineficaz, entre gestores e colaboradores, possa se refletir na comunicação dos seus colaboradores com os seus clientes ou fornecedores?
PSC: Com tudo, porque o líder vai passar uma imagem através da linguagem corporal. Existem empresas, por exemplo, que são extremamente descoladas, como a Google, ou seja, você pode ir lá do jeito que você quiser. Essa é a imagem deles. Existem empresas corporativas [em] que você tem que passar uma imagem de seriedade.

Algumas empresas, na hora de negociar e receber os visitantes, deixam a cadeira mais alta para o diretor e a cadeira da pessoa que vai ficar à frente dele um pouco mais baixa. Quem está ali em cima comanda a negociação. Se você quiser negociar e convencer as pessoas com mais facilidade, em um almoço de negócios, por exemplo, você coloca o seu interlocutor de costas para a parede e você fica para fora. Porque durante milhões de anos, na África, os nossos ancestrais, naquelas savanas sempre abertas, tinham medo de predadores, então quando as costas ficam livres, aumenta a ansiedade, aumenta [o ritmo do] batimento cardíaco. Quando as costas estão protegidas, o nível de batimento cardíaco diminui. [Isso] facilita.

MemF: Quais os principais ruídos de comunicação e como eles interferem na produtividade de uma empresa? Como a gente pode resolver esse problema?
PSC: O ruído de comunicação é uma coisa muito séria. São dezenas de motivos que causam ruídos de comunicação entre as pessoas em uma empresa. O pior exemplo na linguagem corporal é não falar a linguagem do outro. Ou seja: se você, em uma empresa, falar a linguagem do seu funcionário, vai conseguir [atingi-lo] melhor [por meio da comunicação]. Você precisa ter uma linguagem clara e direta para que todos entendam. Quanto menor a mensagem melhor. [É importante] não ter, nas mensagens, qualquer tipo de carga: procurar sempre uma carga emocional e institucional, porque se você colocar carga ideológica na mensagem empresarial, ela se perde. Outro ruído de comunicação é o tempo. […] A mensagem tem que chegar [rápido] e com tempo hábil.

MemF: Que dica você dá para um gestor ou líder trabalhar essa comunicação e esses ruídos com seus colaboradores?
PSC: Dar e receber feedback. Uma pessoa que sabe dar e receber feedback tem a equipe na mão. Dar e receber feedback é uma coisa importantíssima. Escutar o funcionário se torna um ponto importante.



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