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A trilha de desenvolvimento da liderança

Identificar e desenvolver líderes têm sido o objetivo e a necessidade de muitas empresas. Ainda mais num ambiente de negócios altamente competitivo e dinâmico como o que vivemos hoje, no qual as estratégias que eram efetivas no passado não se encaixam mais. O mercado mudou, as empresas mudaram, as exigências dos clientes mudaram, as relações mudaram e as pessoas também mudaram no que diz respeito às suas contribuições, expectativas e valores relacionados ao trabalho.

O processo de adaptação a essas e tantas outras mudanças pode ser facilitado através do emprego de modelos diferenciados de gestão, ferramentas e inovações tecnológicas. Mas o fator decisivo para que essas mudanças ocorram de fato e garantam sua sustentabilidade é uma liderança qualifi cada. Os verdadeiros líderes desenvolvem e compartilham uma visão de futuro e estabelecem a direção a ser seguida. Depois engajam as pessoas, ajudando-as a superarem os obstáculos e inspirando-as a fazer o que precisa ser feito.

Refl etir e aprender sobre liderança faz parte deste novo contexto corporativo, especialmente dentro das empresas que buscam diferenciar-se no mercado e atingir novos patamares de excelência. Os profi ssionais que estiverem dispostos a analisar este tema com maior aprofundamento e a considerar suas implicações práticas no relacionamento com as equipes de trabalho também sairão na frente no quesito resultados.

A liderança está no âmago do discurso na área dos negócios e talvez seja o tema mais popular de toda a literatura. Quase todos os grandes pensadores da gestão moderna já ofereceram suas contribuições, a exemplo do indiano Ram Charam, autor de diversos livros que conquistaram defi nitivamente o topo das listas dos mais vendidos e responsável pelo aconselhamento de alguns dos principais executivos norte-americanos. Suas ideias destacam- -se ainda mais diante das questões ligadas às competências e ao desenvolvimento de liderança. Como é o caso da Teoria do Pipeline da Liderança, que recebeu este nome devido à metáfora do pipeline, um cano que se curva em seis pontos de forma ascendente, fazendo uma alusão aos principais níveis e transições que uma pessoa pode empreender em sua trajetória profi ssional.

Considerando a dinâmica atual das organizações, é fácil perceber que existem diferentes níveis de liderança, que por sua vez trazem diferentes demandas no que diz respeito às competências e responsabilidades daqueles que os ocupam. A cada mudança de nível, é preciso estar consciente e disponível para a adoção de novas capacidades, mudar a perspectiva sobre o que é realmente importante valorizar no papel de líder e com que tipo de atividades o tempo deve ser utilizado.

Esse último ponto, de acordo com minha experiência, é bastante crítico. Quanto mais elevado o nível de liderança, maior deveria ser a sua dedicação de tempo para as pessoas. Contudo, o que se observa é justamente o contrário: a agenda dos gestores é tomada por um sem-número de reuniões, projetos novos, procedimentos que precisam ser constantemente revisados e pela gestão de uma enorme lista de indicadores numéricos. Desta forma, importantes atividades relativas à gestão das pessoas, tais como o diálogo e o feedback constante, a estimulação intelectual e a construção de um relacionamento de confiança acabam fi cando para depois. Um depois que nunca chega a tempo e se transforma em urgência.

Mas vamos retornar às ideias de Ram Charam na Teoria do Pipeline da Liderança e refl etir sobre como elas podem ajudar no seu desenvolvimento no papel de líder. De acordo com essa teoria, existem sete níveis diferentes de liderança: líder de si mesmo, líder de outros, líder de líderes, líder funcional, líder de negócios, líder de geral e líder corporativo. Neste texto, vamos nos concentrar nos dois primeiros níveis e na transição de um para o outro.

O primeiro nível de desenvolvimento implica em ser líder de si mesmo. Sem autodomínio, não há liderança.

Ao analisarmos algumas profissões mais de perto, podemos identificar recursos que potencializam o desempenho daqueles que as escolheram. Os médicos, por exemplo, além de todo o conhecimento que obtiveram na universidade, sua dedicação e empatia com os pacientes, podem contar ainda com a ajuda de poderosos instrumentos de diagnóstico e medicamentos de última geração, o que aumenta consideravelmente suas chances de êxito na recuperação de seus pacientes. Pense nos músicos. É claro que o talento, a sensibilidade e a paixão pela música diferenciam os melhores daqueles que são comuns, mas tudo isso somado a instrumentos de qualidade e estúdios de alta tecnologia garante um resultado de excelência.

Considere agora essa questão: o que os líderes têm para fazer um bom trabalho? Eles têm somente as pessoas e a eles mesmos. Suas competências, experiências, percepções, crenças e valores. A liderança é uma competência que se desenvolve primeiro no campo do autoconhecimento.

Antes de liderar alguém, é preciso conhecer-se o suficiente para dominar as próprias forças, fraquezas e emoções; é preciso dominar o próprio comportamento frente às mudanças e adversidades; é preciso refinar o alinhamento dos valores individuais frente aos valores coletivos; é preciso adotar um novo posicionamento frente às pessoas, à empresa e ao trabalho.

Além disso, é preciso ter a capacidade de se deixar em “segundo lugar” para que as pessoas estejam no primeiro, isto é, conseguir abrir mão de seus direitos e interesses mais legítimos para privilegiar os dos outros. Assumir de fato a responsabilidade pelo desempenho, pelo desenvolvimento e pelo bem-estar das pessoas é uma tarefa que demanda um grande esforço e só se concretiza quando o líder carrega valores convergentes a esse desafi o.

O líder é aquela pessoa que deixou de ser pedra e passou a ser vidraça. Certamente você já se deparou com essa afirmação e quero convidá-lo a refletir sobre o quanto uma pessoa se torna exposta e vulnerável quando assume o desafi o de liderar. As cobranças vêm de todos os lados tanto para a apresentação de resultados, como principalmente para a demonstração de uma conduta correta e consistente. O resultado fi nal, seja ele bom ou ruim, é sempre vinculado à fi gura do líder. Os exemplos que ele irradia terão sempre maior peso do que os discursos lógicos e inteligentes que ele for capaz de fazer.

Mas toda essa mudança não acontece de maneira rápida, automática e natural, como muitos imaginam.

Para a grande maioria das pessoas, a posição de liderança chega como uma recompensa pelo bom desempenho técnico e pelo domínio da função e seus processos, assim como pelo bom entendimento do negócio e da cultura da empresa. Essa dinâmica não é de todo incorreta, pois essa bagagem é indispensável para o exercício das habilidades de gerenciamento e para a sustentabilidade dos resultados. Porém para o bom desempenho na liderança, são exigidas habilidades diferentes, que sejam capazes de estimular e inspirar as pessoas, para que elas tenham acesso ao seu melhor desempenho; habilidades para formar e manter equipes de alta performance; habilidades para a construção de um clima positivo e edifi cante; habilidades para o estabelecimento de relacionamentos pautados por respeito e confi ança. E para o atendimento dessas demandas, nem mesmo o maior domínio técnico do mundo é sufi ciente.

Chegamos então ao segundo nível, ser líder de outros. Para tanto, a mudança comportamental e o reajuste do foco são essenciais.

Quando se está à frente de um grupo de pessoas, a prioridade é criar a melhor condição para que elas façam o seu melhor. Essa condição envolve o uso de uma comunicação clara, objetiva e engajadora; a delegação estruturada de tarefas e responsabilidades; a gestão constante do desempenho; a prática frequente de feedbacks honestos e sinceros; o reconhecimento pelas contribuições; o desenvolvimento de novas capacidades; o empoderamento diante das oportunidades.

Liderar os outros tem a ver com ensiná- -los a aprender. Por muitas vezes nos apegamos à ideia de que não se pode “dar o peixe”, porque desta forma a pessoa teria alimento apenas por um dia. O correto seria “ensinar a pescar”, pois desta forma a pessoa teria alimento por uma vida inteira. Mas quem pode nos garantir que no futuro destas pessoas haverá peixe? Quem pode nos garantir que, no futuro, a pesca ainda será a atividade que vai garantir o sustento e a sobrevivência destas pessoas?

Infelizmente, ninguém. Haja vista a tragédia ocorrida na cidade de Mariana/ MG, com o rompimento de duas barragens da mineradora Samarco, em novembro de 2015. Além da incontável perda ambiental e humana, as famílias fi caram sem seu meio de sustento após a contaminação do Rio Doce.

O caminho mais seguro e próspero é ensinar as pessoas a aprenderem constantemente, apresentando novos cenários e possibilidades, estimulando a criatividade e a abertura às mudanças, fazendo as pessoas pensarem por conta própria, ao invés de fornecer respostas prontas e imediatas, incentivando o questionamento constante das próprias atitudes, crenças e paradigmas que um dia já foram válidos, mas que perderam a conexão com a realidade.

Um verdadeiro líder faz com que as pessoas melhorem a cada dia, a cada experiência, a cada interação. Como nos inspira lindamente a frase de Madre Teresa de Calcutá “não devemos permitir que alguém saia da nossa presença sem se sentir melhor e mais feliz”.

Um grande abraço e até breve.



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